Resumo
Este trabalho apresenta resultados parciais de projeto dedicado a levantar a situação dos arquivos nos sistemas estadual e municipais de cultura do Rio Grande do Sul, por meio da análise dos documentos que permitiram a vinculação do estado e dos municípios no Sistema Nacional de Cultura (SNC). Assim, apresentam-se dados relacionados ao diagnóstico da ligação entre os arquivos e o setor cultural no Estado, buscando suprir a lacuna de conhecimento sobre a presença e representação do setor arquivístico nos municípios, e por consequência, no país. Entre os objetivos específicos colocam-se o mapeamento de sistemas locais de cultura que tenham aderido ao SNC, o levantamento dos documentos que regulamentam a institucionalização de tais sistemas locais, e a verificação nos mesmos a presença ou ausência de instituições arquivísticas nos seguintes aspectos: na organização do sistema cultura local, na constituição de conselhos de cultura e nos planos estadual e municipais de cultura. Como fundamentação teórica, destaca-se a importância dos conceitos de subsistema político (CAPELLA; BRASIL, 2015) e de policy domain (BIRKLAND, 2005). Por subsistema político, entende-se o conjunto de atores políticos, instituições e marcos normativos que se congregam, em determinados espaços geográficos, no sentido de promover os interesses políticos relacionados a determinado tema ou problema. Já o policy domain representa a setorização do atendimento de determinadas demandas pelo Estado, que geralmente resulta ou provoca a constituição de organismos específicos a determinada especialidade burocrática (saúde, educação, cultura etc.). Entende-se que o sistema político arquivístico, que apresenta entre seus elementos o Sistema Nacional de Arquivos (SINAR) e o Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ), pode flexionar-se no sentido do policy domain da cultura, quando permeando-se com o SNC. No Estado do Rio Grande do Sul, um componente importante do subsistema político arquivístico é o Sistema Estadual de Arquivos, composto pelo Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul como instituição arquivística de competência para gerir os documentos arquivísticos do Poder Executivo estadual. Para participar do SNC, os entes federados precisam submeter alguns documentos que demonstrem a estruturação de seus sistemas locais de cultura: legislação em que se baseiam os sistemas de cultura, os organismos de gestão da cultura, o fundo da cultura e o plano da cultura (não necessariamente na mesma lei). Outra necessidade é a criação de um fundo, para o qual o organismo de gestão precisa apresentar registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ). e o plano cultural deve ser aplicado em metas e indicadores (BRASIL, 2011; BRASIL, 2021a). Todos estes documentos podem ser acedidos através de um painel de bordo disponível no sítio web do SNC, se a entidade federada tiver aderido (BRASIL, 2021b). No caso do Estado do Rio Grande Sul, é preciso considerar o próprio estado como mais um ente federado. Como sistema, o SNC não apresenta, em tese, hierarquia entre os membros. A metodologia da pesquisa é sobretudo qualitativa, embora apresente elementos de cunho quantitativo, com objetivos descritivos e procedimentos, de pesquisa documental. A coleta de dados está sendo realizada por meio da importação dos dados disponibilizados no Portal VerSNC para um software de análise qualitativa (AtlasTi), no qual foram criadas etiquetas representando as categorias de organização dos dados (mesorregião, microrregião, município, criação de sistema de cultura, criação de conselho de cultura, criação de fundo de cultura, entre outras) assim como criadas categorias de análise de dados. Para organizá-los, foram atribuídas categorias advindas da divisão dos municípios por mesorregião: nordeste (54 municípios), centro-ocidental (31 municípios) noroeste (216 municípios), centro-oriental (54), metropolitana (98), sudoeste (19) e sudeste (25). Os resultados aqui trazidos são relativos à análise do contexto de citação da palavra “arquivo” e suas flexões, em documentos das cidades que aderiram ao SNC das mesorregiões nordeste, noroeste e centro-ocidental. Nas regiões analisadas foram encontrados 41 municípios com adesão ao SNC. Neste primeiro momento, foram inseridos no AtlasTi apenas os documentos com capacidade de leitura de máquina, ou seja, que estivessem em formato pdf com reconhecimento de caracteres. Essa medida foi necessária pelos limites da versão em nuvem do programa de análise qualitativa, que, no momento da coleta e análise destes dados, é a única passível de utilização, visto que ainda estamos em período de distanciamento social, provocado pela pandemia do Coronavírus. Nos documentos relativos à adesão ao SNC desses 41 municípios, foram encontrados 33 documentos que referiam a palavra “arquivo”. Os documentos remetiam a 19 municípios e o Estado do Rio Grande do Sul. Nestes, foi possível perceber que, embora haja o reconhecimento dos arquivos como setores componentes do patrimônio cultural, e, por isso, parte dos sistemas de cultura, apenas 4 municípios indicavam seu sistema de arquivos como subsistema (Passo Fundo, Nova Prata, Bento Gonçalves e Santa Maria). O Estado do Rio Grande do Sul também não inclui em seu sistema de cultura o Sistema Estadual de Arquivos. Quanto à representação do setor nos sistemas de cultura, apenas três cidades definiram cadeira exclusiva para o setor de Arquivos em seus Conselho municipais de Cultura (Bento Gonçalves, Bom Jesus e Guaporé), ainda que dividindo a representação com museus em dois desses casos. A referência aos arquivos como prioridade no investimento de infraestrutura dos fundos de cultura locais foi citada em 6 municípios (Chapada, Santa Rosa, Nova Prata, Cambará do Sul, Monte Belo do Sul e Veranópolis). No entanto, é preciso refinar a análise pois existe a hipótese de que se trate de uma consequência da incorporação, sem maiores reflexões, do modelo de legislação proposto e disponibilizado como template pelo SNC. Desta maneira, tal reconhecimento pode não ter origem nas demandas locais especificamente relacionadas ao setor arquivístico. Os resultados, ainda que parciais, demonstram a frágil e limitada interação do subsistema político arquivístico no policy domain da cultura no Estado do Rio Grande do Sul. O levantamento está em andamento, estando em curso a coleta de dados relativa às demais mesorregiões (centro-oriental, metropolitana e sudeste). Espera-se contribuir com informações que permitam promover a aderência dos arquivos aos sistemas de cultura, como mais uma forma de recebimento de recursos, caso eles sejam liberados pelo setor público. É importante ressaltar que a aderência a sistemas de cultura não implica vinculação ao órgão gestor do sistema local de cultura. Trata-se da inclusão dos arquivos em um sistema político que lhe compete, ainda que não exclusivamente.
